sexta-feira, 20 de fevereiro de 2009

Rede, Transmissão e Psicanálise - Henrique Senhorini

Henrique Senhorini
Janeiro/2009


Rede, Transmissão e Psicanálise - umLugar


Rede: dois ou mais pontos unidos / interligados por um fio tecendo uma malha, uma conectividade. Segundo o Aurélio, qualquer conjunto ou estrutura que por sua disposição lembre um sistema reticulado. Designação genérico de entrelaçamento.

No caso de uma rede clínica de psicanálise, entendo como um conjunto de clínicas que - por sua estrutura semelhante - se autoriza a transmitir a Psicanálise.
E, especificamente, penso rede como um laço de sustentação / amarração na formação do analista.
Um laço amarrando os três pés do “banquinho”, do tripé analítico
- análise pessoal
- ensino teórico
- supervisão clínica

Mas, não só isso. Também, como um laço social entre os analistas. E constituído pelo desejo de saber (inédito, novo) e/ou o desejo do analista? A propósito, não entendo esses desejos como iguais, mas como semelhantes e complementares.

Um laço constituído, da mesma forma, pelo nosso amadorismo como analistas?
Amador, do latim “amatore” - na perspectiva de Roland Barthes - “é aquele que ama o que faz”. É o amante que se dedica a uma arte ou ofício por prazer, e que visa tão somente ao gozo do fazer, sem se mover pela necessidade de expor o produto acabado ou impor a imagem pública do artista, segundo Sonia Leite, no meu entender, se assemelha a algo do desejo do analista.

Isso sem falar do entusiasta. Aquele que mantém sempre o mesmo frescor de seu primeiro atendimento - pois o que o analista já sabe não lhe serve de nada para escutar um novo analisando - é constituinte do desejo do analista e da rede de transmissão? Transmissão?
Basicamente, penso que na Psicanálise a transmissão sempre está em questão. É algo que passa em Um Lugar.
Não só na relação privada analista e analisando como no público, na teoria, na cultura/sociedade, nas instituições psicanalistas (incluindo a supervisão).

Em cada análise de um sujeito com um analista, a transmissão se dá e produz um psicanalista em Um Lugar, que - por sua vez - poderá repetir essa experiência com seus analisandos, em cada uma de suas singularidades, de acordo com Coutinho Jorge.
Lacan, ao mesmo tempo que afirmou a impossibilidade da transmissão da Psicanálise, sempre trabalhou - conforme o mesmo autor - no sentido de possibilitá-la e insistiu na posição de que seu ensino visava a um efeito de formação. Para Lacan, é impossível transmitir sem que o próprio sujeito tenha passado pela experiência de análise, sem uma estreita ligação entre teoria e prática. Impossível de transmitir como um
saber totalizador, uma vez que é não-toda e que a questão “o que é o inconsciente?” insiste em estar presente. Mas, é esse mesmo “não-todo” que na condição de matriz da estrutura do inconsciente - escrito por Lacan - deve ser transmitido.
A transmissão da Psicanálise, então, seria como algo mais-além do mero ensino, visto que articula o “saber” ao “não-saber”.

E, sendo a análise (Freud) um trabalho de divisão/separação, só pode ser pensada como ação pontual e momentânea, pois ela, à medida que analisamos a vida mental e eliminamos as resistências, unifica-se mais uma vez, sem depender de qualquer interferência externa para isso.
De acordo com Násio, a experiência analítica é uma série de momentos esperados pelo psicanalista, momentos fugazes e, além disso, ideais. Mas, esses momentos não são somente pontos abstratos - são mais que isso. Tem sua face empírica que se apresenta como “o instante em que o paciente diz e não sabe o que diz”. São os momentos onde a linguagem se equivoca e a fala derrapa. Assim, a experiência analítica assumiria os contornos de uma revelação, de um des-velar, segundo Sonia Leite. Esta posição de não-saber (acionada por parte psicanalista) permite, só ela, a emergência da verdade de um saber Outro, o inconsciente. E através da posse dessa verdade, o analisando pode se re-inventar (Forbes), ou seja, modificar seu modo de se inscrever no mundo e modificar seu destino, seu sofrimento.

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